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20 de fev. de 2009

CONSTRUÇÕES CRIATIVAS 1 - das palavras

Há palavras que não precisam ser ditas. Estão implícitas na voz, no gestual, na escrita. Outras, não devem ser ditas de tão gastas e sem sentido. A palavra amor parece que não deve ser pronunciada. Ela é exigente, precisa de tempo para ser construída entre dois seres, precisa de espaço de expansão de sentimentos dos mais variados tipos. Amar implica em permitir-se sentimentos ambíguos. E exige dedicação. Diferente da paixão avassaladora e com um fim determinado. A paixão não traz em si o ato de cuidar, mas o ato de conter, de prender, de consumir.O tempo de hoje faz com que as palavras ditas descuidadamente se tornem sem sentido. A palavra pode ser: acertos e combinações que ocorrerão, a expressão de um sentimento qualquer, os registros da vida, a literatura, os documentos, o trabalho, a bobagem, o lúdico, o importante no dizer sobre nossos afetos Se o hábito as deixou vazias, carecendo de sentido, há que encontrar seu rumo. Na distância, sobrevivem compondo colagem, tatuagem, aromas e memórias. Elas se perdem num sopro? As permanentes palavras são a linguagem que se torna impermanente se relacionada ao tempo de nosso viver. O hoje que deixou de ser, o desejo que ficou no ar, o futuro que só nos cabe sonhar e projetar utopias.Palavras podem adquirir um brilho próprio. Aquecem a alma, amalgamam carinhos quando sua temperatura de cor ressalta o tom exato do aconchego, o ponto certo do cuidado, o ouvido atento na acolhida.Tais palavras? Quem não as deseja ouvir?Valem mais, se inesperadas? Ato falho ou intencional, quando o sentimento perpassa sem querer querendo: pulmão, diafragma, garganta, cordas vocais e saltita reverberando na testa, entre os olhos, como se fosse apenas um simples acorde em ré menor, a voz. Pode ser um monossílabo da soprano no coral da Canção da Alegria de Beethoven ou da ópera Carmem, de Bizet. A musicalidade em sentimentos de amorosos instintos está no sentido de poder. de transpor limites e compor desejos.É quando os aromas, retidos nas histórias vividas, se apropriam do ser e fluídos ocupam seu lugar. É quando o corpo se umedece em natural preparo para o tocar e o ser tocado, no vir a ser de almas que se fundem, em novo devir. Muitas palavras não ditas tomam formas nas entranhas. A guiarem movimentos de viver. Bem viver. Alegria de viver. Saber das palavras que de tão benditas nem precisam ser ditas. Faz bem ouvi-las. Se o tom de voz contiver ternura, elas estarão todas ali, prontas para serem de ambos, pertença e prazer de conviver.

Marilice Costi - 20/09/2009

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