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NA CASA DO SOL, VOLVER À ARTE

Chegou uma nova pessoa no lugar daquela que a tratava desde o início e que sentia suas dores físicas sem se conhecerem. Há anos era cuidada na Casa do Sol. A mulher tinha um largo sorriso e a comprimentou sem estender a mão. O comum de todos.
Lúcia largou a bolsa na mesa ao lado da cadeira e tentou falar. Mas logo lhe disseram que sentasse, fechasse os olhos e relaxasse. E foi o que fez.
Estalares de dedos abriram o seu campo. A nova voz ainda desconhecida de Lúcia passou a falar:
- Vejo esta pessoa na beira de um lago, pintando. Ela é artista? Trabalha com pinturas?
- Ela é arquiteta, disse o homem de pé ao lado dela.
- Ela pinta casas, pasisagens, coisas? Ela está confusa, sentem-se insatisfeita com o que tem feito. Confusa, sem rumo. Como se sempre estivesse tentando sem conseguir, andando e andando sem conseguir chegar.- E solicitou ao homem de pé ao lado de Lúcia: Abra mais seu campo. Há um veu impedindo que vejamos mais.
- E dá pra remover? - disse o homem antes de estalar novamente os dedos.
- Sim - disse ela. Mas o veu está preso em ferros, há garras metálicas que precisamos retirar.
- Inverter o campo magnético! - Lúcia ouviu a voz masculina bem próxima de si.
- Ela está presa em uma mão, parece uma mão metálica, robótica.
- Vamos desagregar! - de  novo ele comanda.
As mulheres ao redor da mesa estão todas de olhos fechados. Sintonizadas na mesma energia e objetivos.
- Isto está preso. Vamos abrir o campo.- Novamente o homem faz a sua parte.
- Vejo um prédio grande, parece um castelo. Na parte superior, há uma sala redonda. Tem um homem ali cheio de medalhas, parece um general. Ele a controla e faz com que ela fique sozinha, distante dos outros e assim consegue. É um antigo afeto que a quer para si. Espere, ele comanda muitas pessoas dessa torre circular.
- Então, vamos tirar suas medalhas - o homem agora demonstrando sotaque italiano disse:
- Delicadamente, tirando, desmanchando, mandando para outro...
- Espere, precisamos tratá-lo. Ele parece demente e a mantém presa para que ela não tenha luz.
- Mandando para o hospital! 1, 2, 3, 4, 5, 6 - ele conta e estala novamente os dedos. - Liberando os demais para espaços de alegria, de conforto, de luz. 1, 2, 3, 4. - continua.
- As garras, precisamos mandá-las para o laboratório, disse a mulher.
- Mandando para o laboratório. 1, 2, 3. De novo o som ritmado.
- Agora ela está livre, agora vai conseguir.
Lúcia estava totalmente entregue àquela sessão na Casa do Sol. Sentia leve tontura, um estranhamento.
Sempre tinha colo quando ia ali naquela casa cheia de cupins na subida do morro. Mas era hora de encerrar a sessão.  Tanto que tinha vontade de voltar daquele momento de entrega, mas não estava fácil.
Lúcia confirmou o que a mulher dissera, que precisava criar e não se sentia com espaço, que era ligada às artes desde pequena. Que precisava escrever.
A outra mulher perguntou dos filhos de Lúcia, como estavam e como ela estava se sentindo. E afirmou: as coisas vão melhorar.
Vão lá quase 5 anos. Lúcia retomou sua arte. Passou a escrever mais. A desenhar, a fazer as coisas para as quais havia sido feita. E então... surgiu aos poucos a revista O CUIDADOR.